por Adriano Brandão
Schubert compôs canções. Muitas, e várias delas serviram de base para obras instrumentais. Vêm à minha cabeça as mais famosas: o Quarteto de cordas no. 14, baseado na canção “A morte e a donzela”, e o Quinteto para piano e cordas, dito “A truta”, sobre a canção de mesmo nome.
Mas de todas as peças schubertianas baseadas em canções, a minha favorita é mesmo a Fantasia para piano, D. 760, de 1822. Ela usa como base a canção “O andarilho” (“Der Wanderer” no original, e por o apelido de Fantasia “Wanderer” que a obra recebeu), de 1816, que é a seguinte:
A canção é estruturada em quatro partes. Preste atenção na segunda parte, a mais lenta e soturna de todas. É desse motivo que Schubert extrairá todo o material temático da Fantasia. Isso fica particularmente explícito no segundo movimento, um conjunto de variações sobre o tema – exatamente como nas peças de câmara citadas acima!
Mas a coisa é ainda mais intrincada e sutil: os outros três movimentos da Fantasia (todos tocados sem interrupção) também são baseados nessa melodia, distorcida ao ponto do não-reconhecimento. A obra resulta, portanto, numa mistura muito sofisticada de sonata e de variação, e é certamente por isso que Schubert chamou a obra de “Fantasia” e não de “Sonata”. Fosse 1850 e ele não teria tal pudor!
O último movimento da Fantasia é especialmente surpreendente: é uma espécie de fuga sobre uma variação do tema da canção. É extremamente difícil para o intérprete, e mega excitante para o ouvinte. Mas minha parte predileta é o movimento lento, em que Schubert – à parte a maravilha da engenharia que sustenta a obra – atinge níveis absurdos de sublimidade. Existe essa palavra? Bom, que seja: é sublime, causa apneia, é DO GRANDE CARVALHO!
Dos mesmos diretores de Ilha Quadrada, eis o Concertmaster, um front-end que transforma o Spotify em um poderoso player de música clássica. GRÁTIS!Post escrito por Adriano Brandão em 26/03/2014. Link permanente.