Milhaud

“Suíte provençal”

por Adriano Brandão

Politonalidade.

Ô nome feio. Mas o efeito é bem legal.

Um dos artigos da Constituição da Ilha Quadrada, que um dia hei de publicar, diz que a boa comunicação musical não deve ser técnica demais nem de menos – deve-se respeitar a inteligência do leitor-ouvinte mas também não deve-se assumir que ele seja (ou devesse ser) profissional.

Por isso limitamos a informação técnica ao mínimo necessário. Até porque esse também é o MEU limite de conhecimento. Não sou profissional de música. Sou ouvinte!

Mas voltemos à politonalidade :) Como o próprio nome diz, trata-se de música que acontece em duas tonalidades simultaneamente. Tonalidade? Pense num carro. Quando trocamos de marcha, a rotação do motor muda e percebemos isso imediatamente – o barulho, o jeito como o carro anda, tudo dá a sensação de ter subido ou descido um degrau de uma “escada” sensorial. Tonalidade é o degrau musical. Quando uma peça musical muda de tom, de “degrau”, acontece o que se chama de “modulação”. É razoavelmente fácil perceber a diferença.

(Tem um site muito engraçado sobre modulações forçadas em música popular, chamado apropriadamente de “The Truck Driver’s Gear Change”: http://www.gearchange.org/FAQ.html)

Agora imagine dois motores de carro em rotações diferentes ao mesmo tempo. Não, não imagine não! Faça na prática: clique no vídeo abaixo e ouça a “Suíte provençal” de Darius Milhaud, um dos exemplos mais divertidos de politonalidade. A suíte, composta em 1936, apresenta logo de cara uma fanfarra em que as vozes agudas e graves estão em “degraus” tonais bem diferentes. É a troca de marcha do caminhoneiro em versão TUDO AO MESMO TEMPO. :-D

Milhaud adorava brincar com tonalidades simultâneas. Sua obra “Saudades do Brasil”, composta após sua temporada no Rio de Janeiro (ele foi secretário de Paul Claudel, adido cultural francês no Brasil), é repleta de trechos bitonais. Politonalidade também era “trendy” na época de Milhaud, as primeiras décadas do século 20. Stravinsky a usou extensivamente em “Petrushka” e “A sagração da primavera”, por exemplo. O efeito sempre é interessante.

Curta a “Suíte provençal” abaixo, tentando prestar atenção nas diversas vezes em que as vozes musicais parecem brigar entre si. É incrivelmente divertido! (E a obra em geral, baseada em temas e ritmos folclóricos da Provença, é muito bacana também.)

Dos mesmos diretores de Ilha Quadrada, eis o Concertmaster, um front-end que transforma o Spotify em um poderoso player de música clássica. GRÁTIS!

Post escrito por Adriano Brandão em 20/09/2012. Link permanente.