Ravel

“A valsa”

por Adriano Brandão

A hoje inofensiva valsa já foi considerada inebriante, capaz de fazer “bons cidadãos” cometerem atos ofensivos aos “costumes”. Acho que a culpa era dos rodopios. Faça o teste aí: saia do Facebook por um instante e dê umas giradas. (OK, não tente se acabou de comer.) Surge uma zonzeira mesmo.

Tergiverso. O fato é que a valsa, inicialmente coisa de pobre lascivo, no final do século 19 já tinha se tornado o símbolo perfeito de um certo status quo – a aristocracia centro-europeia. As valsas de Johann Strauss Jr e de Émile Waldteufel eram o próprio bom-mocismo em forma de música.

O tempo passou, o século virou, a guerra veio, e a aristocracia já tinha ido pro buraco. Com ela, a valsa. Tornou-se decadente, deprimente, irremediavelmente cafona, uma sombra de um mundo que já não existia mais.

Esse é justamente o plot de uma das obras orquestrais mais famosas do francês Maurice Ravel, “A valsa”, de 1920. É uma grande valsa sinfônica. Ela começa lentamente, atinge um ápice e termina em grande e abrupto caos. A imagem oficial é de um salão de baile visto acima das nuvens, que vamos atravessando até vermos de perto.

Legal. Mas a minha visão é mais psicodélica. “A valsa” é como se Strauss Jr tivesse tomado mescalina – a obra começa com torpor, continua em euforia e termina em terror. É uma valsa lisérgica, distorcida e apocalíptica, como uma viagem ruim.

Sensacional, totalmente anticonvencional e digno retrato de uma belle époque que, em 1920 – a Primeira Guerra terminara há pouco – estava se tornando cada vez mais distante.

Vamos! Rodopiem!

Dos mesmos diretores de Ilha Quadrada, eis o Concertmaster, um front-end que transforma o Spotify em um poderoso player de música clássica. GRÁTIS!

Post escrito por Adriano Brandão em 08/11/2012. Link permanente.