Vivaldi

“As quatro estações”

por Adriano Brandão

A obra mais famosa de Vivaldi, da música barroca e uma das mais célebres de todos os tempos: “As quatro estações”, conjunto de quatro concertos para violino composto em 1723 e publicado dois anos depois dentro de um set maior, de doze concertos, chamado “O confronto entre a harmonia e a invenção”.

Esse conjuntão é o Opus 8 de um compositor que compunha muito e publicava muito pouco. Só que o que Vivaldi publicava se espalhava rapidamente pela Europa inteira. Músicos de todo o continente tinham paixão pelos concertos desse misterioso padre veneziano. Bach, lá em Leipzig, tinha partituras de várias peças de Vivaldi entre seus pertences. Chegou a arranjar alguns de seus concertos para outros instrumentos. E não só ele – “recompor” Vivaldi era prática corrente (bom, é até hoje).

A explicação é óbvia à primeira audição: as obras instrumentais de Vivaldi são tão simples e criativas que praticamente imploram por uma abordagem de reconstrução. Elas são um poderoso combustível para a imaginação. E o próprio nome do Opus 8 já entrega isso: um confronto entre harmonia (a “moderação” artística) e invenção (a “chama” da ousadia que cria o novo).

Os concertos d”As quatro estações” que se tornaram tão famosos são praticamente uma prova de conceito, uma espécie de happening barroco. Quatro sonetos sobre as estações do ano são a base de quatro concertos para violino, que, sem escapar da forma vivaldiana de concerto (três movimentos, rápido-lento-rápido), são verdadeiros desfiles de imagens e alusões simbólicas. É mega fácil ouvir cachorros latindo, pássaros cantando, o calorão que dá moleza, tremores de frio, uma tempestade de verão, a chuva que cai na janela…

Também é mega fácil transformar esse monte de imagens em um festival de clichês edulcurados para o deleite de preguiçosos. “Ah, o pintassilgo, que lindo” e melífluos violinos a botar-lhe uma moldura dourada. Os Vivaldis que foram criados pela posteridade – o Vivaldi de sabonete, o Vivaldi de lata kitsch de biscoito amanteigado, o Vivaldi escrito em cursivas douradas – não poderiam ser mais distantes do Vivaldi real. Em cada um desses concertos mais-do-que-batidos encontra-se uma mente que fervilhava, que queria muito mais soltar a imaginação (e chocar mesmo!) do que agradar.

As gravações abaixo, de Rinaldo Alessandrini e seu grupo Concerto Italiano, representam uma visão muito mais adequada d”As quatro estações”. Pelo menos para mim. São recheadíssimas de improvisos, pausas dramáticas, abruptas mudanças de direção. Chegam ao ponto do maneirismo? Ah, algumas vezes. Mas são, acima de tudo, vivas e radicais. E não consigo pensar Vivaldi de outro jeito.

As gravações de Alessandrini não estão disponíveis no Spotify. Abaixo, a excelente, porém mais tradicional, versão de Trevor Pinnock com Simon Standage.

Dos mesmos diretores de Ilha Quadrada, eis o Concertmaster, um front-end que transforma o Spotify em um poderoso player de música clássica. GRÁTIS!

Post escrito por Adriano Brandão em 19/02/2013. Link permanente.