Villa-Lobos

“Bachianas brasileiras” no. 7

Domingo é dia de música brasileira aqui na Ilha Quadrada! \o/

(Inventei isso agora! ;-) Espero seguir.)

A série das nove “Bachianas brasileiras” é o conjunto mais popular de obras do nosso maior compositor. As duas primeiras foram compostas em 1930, as outras sete são dos anos 1940. Quer dizer, pertencem ao Villa mais comportado, relativamente “neoclássico”, e não ao Villa modernista, “selvagem”, dos anos 20 (época dos “Choros”). É música mais irregular, com menos “wow moments”, mas ao mesmo tempo mais acessível e comunicativa.

Como fica bem claro no título, o objetivo de Villa-Lobos ao compor as “Bachianas” era aproximar a linguagem da suíte barroca à música brasileira. Os nomes dos movimentos exemplificam bem isso, ao colocar lado a lado um termo formal barroco – “prelúdio”, “tocata”, “giga” – a um nome característico brasileiro – “Canto da nossa terra”, “Quadrilha caipira”, “Modinha”. Com esse gesto, Villa se alinhava, com certo atraso e a seu jeito, ao que se fazia na Europa (“Pulcinella” de Stravinsky, “Os pássaros” de Respighi).

Atitudes clássicas villalobianas: cada obra se chama “Bachianas”, sempre no plural; e as nove obras do ciclo são muito diferentes entre si. Tem “Bachianas” para piano solo, para coro a capella, para orquestra de violoncelos, para soprano e oito violoncelos, para orquestra reduzida, para piano e orquestra, para grande orquestra sinfônica…

A minha “Bachianas” predileta é a sétima, de 1942, para grande orquestra. É a mais sinfônica das nove, super equilibrada. Ao primeiro movimento, um “Ponteio” majestoso e emocionante, seguem-se dois movimentos rápidos, “Quadrilha caipira” e “Desafio”, e uma FUGA FODA que serve de finale. É uma verdadeira sinfonia, melhor talvez que as próprias sinfonias de Villa-Lobos.

A Sétima não ficou tão famosa quanto as “Bachianas” de número 2 ou 5, tão mais características. Mas é obra emocionante que vale ser conhecida. Aliás, cabe aqui um desabafo: TODO BRASILEIRO deveria conhecer bem Villa-Lobos. Lemos Castro Alves, Gonçalves Dias, José de Alencar e Machado de Assis na escola, mas não escutamos Villa-Lobos. Escolas deste Brasil-sil-sil: SHAME ON YOU! Sermos tão ignorantes a respeito do nosso maior músico é uma imensa vergonha.

[As “Bachianas” são mais comentadas que gravadas. Até pouco tempo atrás, pouquíssimas gravações dessas obras tinham qualidade aceitável. As feitas pelo próprio compositor na França, apesar de historicamente importantes, têm som lamentável e execução orquestral errática. O ciclo de Karabtchevsky com a OSB é um show de horrores. Para salvar a pátria, só as gravações isoladas de Enrique Bátiz em Londres e de Michael Tilson Thomas em Miami. Hoje felizmente temos disponíveis dois belos ciclos, que, enfim, fazem jus à música: o de Roberto Minczuk com a OSESP e o de Kenneth Schemerhorn em Nashville. A gravação abaixo é a de Schemerhorn.]

Mozart

Concerto para piano no. 23

Toda viagem tem um ponto de partida. A minha incursão pela música clássica começou nos concertos para piano de Mozart. O começo foi tão bom que não parei de viajar até agora ;-)

Na verdade, provavelmente eu devo ter escutado outras peças antes, como a Quinta de Beethoven ou algo de Chopin. Mas as primeiras obras que realmente agarraram meu pescoço e não me deixaram sair mais desse mundo foram os Concertos nos. 21 e 23 de Mozart.

Tinha 8, 9 anos e me lembro como se fosse ontem: fita cassete preta, de uma coleção de banca de jornais, lado A com o Concerto no. 21, lado B com o Concerto no. 23. Interpretações de Arthur Rubinstein, acompanhado pela orquestra da RCA regida por Alfred Wallenstein. Devo ter gastado a fita de tanto tocar! Não sabia de qual concerto eu gostava mais, mas hoje tenho certeza: é do Concerto no. 23, que apresento agora :)

Os concertos de Mozart são tão, tão perfeitos que me sinto meio sem palavras. São minhas obras de Mozart prediletas e meus concertos favoritos, apesar de Brahms e Beethoven. Ele escreveu 26 concertos para piano, em todas as fases de sua vida. Este vigésimo-terceiro é de 1786, quando a curta vida de Wolfgang já se caminhava para o fim. É, portanto, obra do ápice da carreira do compositor.

Chama a atenção neste concerto o segundo movimento, de um patetismo inédito, extremamente profundo e emocionante. A música é tão maravilhosa que… bom, melhor já ir separando os lenços :)

Beethoven

Sinfonia no. 3, “Eroica”

[Este post foi trazido a você pelo AMIGO INTERNAUTA ;-)]

Se Haydn foi o pai da sinfonia, Beethoven é o pai da sinfonia moderna. E tudo começou aqui, nesta “Eroica”, a Sinfonia no. 3.

Peraí, tudo começou na Terceira? Sim. As duas primeiras sinfonias de Beethoven ainda são música do século 18, totalmente ligadas ao modelo haydniano. Já a Terceira é outra história. Ao incorporar à obra todo um peso extramusical e ao modificar a estrutura da sinfonia para que ela se adapte à mensagem que o compositor queria passar, Beethoven dá um inédito salto à frente.

A obra é de 1804. Dois anos antes, Beethoven tomaria uma decisão que mudaria a história (não só da música): não se matar. Beethoven estava ficando cada vez mais surdo e foi aconselhado por médicos a passar um tempo no campo, em um cidadezinha perto de Viena chamada Heiligenstadt. Lá, tomado pelo desespero, cogitou o suicídio. Mas mudou de ideia: decidiu viver, mesmo em sofrimento, para fazer sua arte e deixá-la não a seus contemporâneos, mas para a posteridade.

Escreveu isso em uma carta aos irmãos, que nunca enviou. Descoberta em 1827, a carta tornaria-se célebre como o “Testamento de Heiligenstadt”. Acho que é a maior profissão de fé jamais escrita. É provavelmente a primeira vez que um artista dedica claramente os seus esforços A TODA A HUMANIDADE, não a algum deus, ao público ou a um mecenas. Além disso, Beethoven planejou conscientemente sua obra para o futuro – um LEGADO.

O “Testamento de Heiligenstadt” posto em música é a “Eroica”. Muita tinta e kilobytes já foram usados para contar a história da dedicatória a Napoleão etc etc. Isso pouco importa – o herói da “Eroica” é Beethoven, em particular, e o ser humano, no geral. O relevante mesmo é testemunhar a criação de uma obra monumental, profundamente original e que inauguraria o Romantismo musical. O primeiro movimento, tão ou mais longo que várias das sinfonias de Haydn, tem tantas novidades que é até difícil listar aqui. O segundo é uma marcha fúnebre, com inúmeras mudanças emocionais. O terceiro é um scherzo, muito pouco parecido com os minuetos das sinfonias setecentistas. E o quarto, incrível, é um tema e variações, com fuga final.

Os contemporâneos pensaram: WTF? Isso é uma sinfonia? 55 minutos? No que Beethoven estava pensando?

Em nós, caríssimos. Beethoven pensava em nós. Obrigado, Ludwig!

Brahms

Variações sobre um tema de Handel

A forma musical que mais me fascina é a de variações.

De todas as formas musicais, a de variações é a que mais me fascina.

Variações: a que mais me fascina, de todas as formas musicais.

A que mais me fascina, de todas as formas musicais, é a de variações.

Ver um simples tema se desdobrar em um milhão de possibilidades, diferentes entre si mas mantendo intacta a identidade básica, é um espetáculo incrível para o cérebro e uma festa para os ouvidos.

Ah, se eu fosse compositor! Quantos “Temas e variações” eu não faria? Brahms fez. Compôs 8 conjuntos de variações, todos para piano (duas ou quatro mãos, ou dois pianos). Um deles, sobre um tema atribuído a Haydn, ganhou do próprio compositor célebre versão orquestral.

Mas hoje vamos falar do meu conjunto favorito de variações: as “Variações sobre um tema de Handel”, para piano. PUTZ, QUE MÚSICA! Compostas em 1861, são baseadas em um tema de cravo de Handel muito simples e marcante, apresentado, como de costume, no comecinho da obra. Em seguida, 25 variações, UMA MAIS FODA QUE A OUTRA, explorando o motivo handeliano até a exaustão. Exaustão? Ritmos, expressões, melodias, harmonias, Brahms faz absolutamente de tudo com o trechinho barroco. Se quisesse, comporia mais umas trezentas variações, tenho certeza.

Quando você já está em êxtase absoluto, imaginando que nada no mundo poderia ser mais incrível que o que acabou de ouvir, Brahms apresenta A MAIS IMPRESSIONANTE FUGA PÓS-BACH. Meu, é indescritível! A fuga final das “Variações Handel” é música que te queima sem dó nem piedade. A vontade que dá é de dar pulos de alegria, sair correndo e mostrar pra todo mundo: “escuta isso aqui! escuta agora! JÁ!”

É o que estou fazendo cá nesta Ilha ;-)

Messiaen

Sinfonia “Turangalîla”

Turangalîla.

Essa expressão em sânscrito parece que tem um significado mais ou menos assim: “canção de amor e hino de alegria, do tempo, do movimento, da vida e da morte”. Em resumo, paz e amor, bicho.

É o que quis expressar o compositor Olivier Messiaen quando compôs uma das maiores obras do século 20, a Sinfonia “Turangalîla”, de 1948. Para grande orquestra, com imenso arsenal de percussão, a “Turangalîla”, além da mensagem hippie avant la lettre, chama atenção por ser uma sinfonia de DEZ movimentos com dois instrumentos solistas: piano e ONDAS MARTENOT.

— PAUSA —

Sabe o que é ondas Martenot? É um instrumento eletroacústico, que se toca puxando um anel por uma espécie de cordão de aço, criando glissandos realmente fantasmagóricos. Alternativamente toca-se dedilhando um teclado igual ao de um piano, para gerar sons parecidos com o de um sintetizador antigo.

— FIM DA PAUSA —

Os nomes dos dez movimentos da sinfonia são tão interessantes quanto o da obra: entre eles, “Jardim do sono do amor”, “Desenvolvimento do amor” e o meu predileto, “Alegria do sangue das estrelas”. Repeat after me: “alegria do sangue das estrelas”. DOIDÃO.

Messiaen era uma criatura muito sui-generis. Católico devoto, mas de preocupações esotéricas, tinha a chamada “sinestesia”. Ele conseguia avaliar sons em termos de cores. Uma vez, em um ensaio da “Turangalîla”, chegou a pedir ao regente que fizesse tal trecho “um pouco mais marrom”, pois estava saindo “muito amarelado”.

Messiaen também era maluco por pássaros. Ele colecionava seus cantos, chegando a viajar só para fazer isso. Anotou melodias de centenas de espécies diferentes e usou diversas em suas próprias obras. É fácil de perceber isso na “Turangalîla”. Ouça o quinto movimento – “Alegria do sangue das estrelas”, adoro escrever isso! – e saque os cantos dos pássaros gritados e respondidos, várias vezes.

(Na verdade, acho mesmo que os ritmos inusitados dos cantos dos pássaros influenciaram o jeitão particular da melodia de Messiaen, e fica difícil distinguir o canto natural de um pássaro de um “canto artificial” inventado pelo compositor.)

Adoro Messiaen! Ele criou música tão inventiva, tão original, tão cheia de personalidade. E incrivelmente excitante também. A “Turangalîla” é minha obra de Messiaen predileta. Impossível ficar indiferente a ela. EXPERIMENTE!

[Ver a “Turangalîla” é uma experiência especial. As diferentes percussões e os solos de piano e ondas Martenot tornam o espetáculo visualmente intrigante. Além disso, o vídeo abaixo tem direção de câmara espetacular, realmente notável. Imperdível!]

Mendelssohn

Octeto de cordas

Ontem falamos da Sinfonia de Bizet, composta quando ele tinha 17 anos. Hoje falaremos de outro gênio da música que criou grandes obras-primas também muito novinho: Justin Bieber.

NÃO! Mentira!

Falaremos de Felix Mendelssohn, é claro! Adoro sua música, e sabe qual é a obra de Mendelssohn de que gosto mais? O Octeto para cordas, composto quando ele tinha 16 anos, em 1825. DEZESSEIS ANOS. Uau!

Na verdade, o Octeto de Mendelssohn é uma das grandes obras-primas do século 19 – é um milagre que tenha sido criado por um autor tão novo. O mais interessante em Mendelssohn é que seu estilo praticamente não evoluiu com o tempo. Ele já nasceu um compositor maduro? Talvez. Se compararmos a Abertura de “Sonhos de uma noite de verão”, composta quando tinha 17 anos, com o restante da música incidental, composta dezesseis anos depois, isso fica nítido: o estilo não muda, já estava lá, prontinho, desde sempre.

A infância de Mendelssohn foi extraordinária. Filho de uma família rica de Hamburgo, conviveu desde criancinha com matemáticos, filósofos, artistas. Até Goethe era amigo do pequeno Felix!

Essa alegria de viver e esse amor realmente incrível por música transbordam nas peças do jovem Mendelssohn (as obras dele maduro revelam outras facetas, diferentes, e realmente parecem menos espontâneas). O Octeto é realmente uma obra em altíssima voltagem. Que arte incrível! QUE FODA! Que inveja…!

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Bizet

Sinfonia em dó maior

Segunda-feira é dia de dar seguimento à nossa série “História e glória da sinfonia romântica francesa, de Gounod a Dukas (ou) O incrível caso das sinfonias gêmeas”. Sente-se e fique à vontade :)

Na semana passada, falamos da Primeira Sinfonia de Gounod, uma obra de 1855 que bem poderia ter sido escrita por Mendelssohn 25 anos antes. Apesar do incrível anacronismo, a sinfonia foi um sucesso. Registros apontam que ela foi executada uma dezena de vezes em seu ano de estreia, só em Paris, um feito realmente admirável para a época. Além de ter emplacado sua sinfonia, Gounod – como era praxe – também buscava o sucesso no teatro (conseguiu quatro anos depois, com a ópera “Romeu e Julieta”) e dava aulas no Conservatório de Paris.

Tinha, portanto, seguidores. Um deles tinha 17 anos, era seu aluno no Conservatório e tinha um talento incrível. O nome: Georges Bizet. É, o mesmo Bizet da ópera “Carmen”! Para conseguir um dinheirinho extra, o jovem Bizet realizou a transcrição para dois pianos da Primeira de Gounod. Em seguida, ganhou do próprio mestre uma tarefa: compor uma sinfonia.

O resultado é esta Sinfonia em dó maior, completada no final de 1855. Tarefa realizada, Bizet estava satisfeito. Colocou a sinfonia em uma gaveta e seguiu seus estudos. Em 1858 ganharia o Prêmio de Roma e começaria uma carreira que, mesmo auspiciosa, nunca atingiria pleno sucesso – “Carmen”, de 1875, teve estreia desastrosa – e que terminaria tragicamente cedo com a morte precoce do compositor.

(Nem é preciso dizer que, postumamente, “Carmen” estourou para se tornar, talvez, a ópera mais popular de todos os tempos.)

Mas tergiverso :) Prêmio de Roma, “Carmen” e morte precoce se passaram, e a Sinfonia em dó maior ainda estava na gaveta. A viúva do compositor acabou passando o manuscrito adiante, que de mão em mão acabou na biblioteca do Conservatório. Muitos anos depois, em 1933, a partitura chamou a atenção de um historiador que a mostrou para o famoso regente Felix Weingartner. Ele se apaixonou pela obra e, em 1935 – exatos 80 anos após sua composição -, a sinfonia enfim estreava.

Nenhuma surpresa: a obra é muito parecida com a Primeira de Gounod. Total surpresa: a obra é MUITO MELHOR que a Primeira de Gounod. Mesmo sendo IRMÃ GÊMEA da criação célebre de seu professor, a sinfonia de Bizet revela muito mais viço e inspiração. Ouça só o belíssimo movimento lento, amplamente anunciador de obras futuras como “Os pescadores de pérolas”. É encantador – e Bizet só tinha 17 anos!

Com a advocacia de Weingartner, a Sinfonia em dó maior conquistou o público e hoje faz parte do repertório padrão. Já a Primeira de Gounod foi praticamente esquecida.

Mas isso aconteceu no século 20. No século 19, a sinfonia romântica francesa iria seguir outros caminhos. Segunda-feira que vem continuamos essa história :)

Haydn

Sinfonia no. 103, “Toque do tímpano”

Beethoven escreveu 9 sinfonias. Desde então esse número tornou-se um Everest simbólico a povoar o imaginário dos compositores. Mahler tinha tanto medo de escrever sua Nona que evitou dar o nome “sinfonia” à “Canção da terra” (provavelmente tão ou mais sinfônica que a Oitava). Além de Mahler, Bruckner, Schubert e Dvorák, cada um à sua maneira, “respeitaram” esse número.

Beethoven escreveu 9 sinfonias, todas muito diferentes entre si. Principalmente após a “Eroica”, compor sinfonias tornou-se um enorme fardo. Toda sinfonia tinha que ser mais original, mais monumental, mais importante que a antecessora. Brahms chegou a reclamar do peso que Beethoven havia dado ao gênero, e demorou mais de 40 anos para completar a sua Primeira. Muitos compositores só escreveram uma sinfonia, e geralmente quando maduros.

Isso não durou para sempre. O século 20 iria tornar a criação sinfônica mais leve, com autores como Shostakovich, dono de 15 sinfonias, e Milhaud e Villa-Lobos, com 12. (Há casos extremos, como do britânico Havergal Brian e suas 32 sinfonias, e do americano Alan Hovhaness, que compôs 67!)

E antes de Beethoven também era bem diferente. Mozart compôs 41 sinfonias numeradas e o grande definidor do gênero, Franz Joseph Haydn, compôs 104. É isso mesmo: CENTO E QUATRO SINFONIAS!

Mas como? Haja imaginação! Pois então, livre das amarras de originalidade que o romantismo iria criar, Haydn compunha sinfonias naturalmente, sem tanta necessidade de criar uma obra arrasadora após a outra. E simplesmente fez música da maior qualidade. “Simplesmente”? São cento e quatro lindas sinfonias! O cara era MUITO FODA!

Haydn compôs tanto que costuma-se dividir suas sinfonias em blocos. Há as sinfonias “Paris”, as sinfonias “Sturm und drang” e assim por diante. O bloco mais famoso é o último, das 12 sinfonias “londrinas”, compostas para duas séries de concertos que Haydn fez em Londres em 1791 e 1795.

Escolhi para mostrar para vocês a minha sinfonia de Haydn predileta (não, não conheço todas!): a 103, dita “Toque do tímpano”. Ela tem esse apelido por que… bem, escutem e vocês vão perceber! :) A música é incrível, eletrizante do início ao fim. Se existisse um compositor hoje que, para uma turnê, compusesse DOZE obras assim tão geniais, eu juro que tatuaria o nome dele na minha testa.

Pensando bem, melhor não :)

Bach

Concerto de Brandenburgo no. 5

[Post escolhido pelo AMIGO INTERNAUTA :)]

Brinquedo novo é uma delícia!

Em 1719, Johann Sebastian Bach, quando ganhou um super cravo, brilhando de novo, do seu patrão, o príncipe de Köthen, sentiu-se imediatamente impelido a testá-lo e demonstrá-lo. Daí fez duas coisas inéditas: compôs um concerto grosso com cravo solista e, mais ainda, inseriu uma cadência GIGANTESCA para cravo no meio do primeiro movimento. É o que a posteridade veio a chamar de Concerto de Brandenburgo no. 5.

“Cadência” é o nome que se dá para espaço para uma improvisação virtuosística solo que surge dentro de uma obra maior como um concerto. Funciona assim: no meio da peça, a orquestra se cala, e o solista ganha espaço para improvisar e demonstrar sua habilidade.

A tradição manda o compositor não escrever cadências obrigatórias. Geralmente, ele deixa um espaço em branco – INSIRA SUA CADÊNCIA AQUI – para que o intérprete faça o que quiser, provavelmente tocar variações de bravura sobre os temas da obra. Alguns intérpretes famosos anotaram suas cadências, para que sejam posteriormente usadas por outros músicos – é o caso das célebres cadências de Kreisler para o Concerto para violino de Beethoven e de Joachim para o Concerto para violino de Brahms.

Mas toda essa história surgiu no final do período clássico e se consolidou no romantismo. Na época de Bach não existia nada disso. Na verdade, nem existia muito claramente o conceito de concerto para teclado solista: o cravo era muito mais usado como acompanhamento. Cravo solo em um concerto grosso, novidade. E ainda por cima com tamanho espaço para o cravista, sozinho, mostrar sua destreza e expressividade? Uau!

Bach era Bach, e testou seu brinquedo novo da maneira mais sensacional possível. A cadência que ele compôs é realmente impressionante, um tour-de-force incrível para o cravo. SONZERA de altíssimo nível, para deixar guitarrista de heavy metal envergonhado.

Chega de falar – agora é hora de escutar Bach. O vídeo abaixo faz parte da recente e superba série dos Brandenburgos de Claudio Abbado (com caras como o violinista Giuliano Carmignola e o cravista Ottavio Dantone, que arrebentam!).

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Milhaud

“Suíte provençal”

Politonalidade.

Ô nome feio. Mas o efeito é bem legal.

Um dos artigos da Constituição da Ilha Quadrada, que um dia hei de publicar, diz que a boa comunicação musical não deve ser técnica demais nem de menos – deve-se respeitar a inteligência do leitor-ouvinte mas também não deve-se assumir que ele seja (ou devesse ser) profissional.

Por isso limitamos a informação técnica ao mínimo necessário. Até porque esse também é o MEU limite de conhecimento. Não sou profissional de música. Sou ouvinte!

Mas voltemos à politonalidade :) Como o próprio nome diz, trata-se de música que acontece em duas tonalidades simultaneamente. Tonalidade? Pense num carro. Quando trocamos de marcha, a rotação do motor muda e percebemos isso imediatamente – o barulho, o jeito como o carro anda, tudo dá a sensação de ter subido ou descido um degrau de uma “escada” sensorial. Tonalidade é o degrau musical. Quando uma peça musical muda de tom, de “degrau”, acontece o que se chama de “modulação”. É razoavelmente fácil perceber a diferença.

(Tem um site muito engraçado sobre modulações forçadas em música popular, chamado apropriadamente de “The Truck Driver’s Gear Change”: http://www.gearchange.org/FAQ.html)

Agora imagine dois motores de carro em rotações diferentes ao mesmo tempo. Não, não imagine não! Faça na prática: clique no vídeo abaixo e ouça a “Suíte provençal” de Darius Milhaud, um dos exemplos mais divertidos de politonalidade. A suíte, composta em 1936, apresenta logo de cara uma fanfarra em que as vozes agudas e graves estão em “degraus” tonais bem diferentes. É a troca de marcha do caminhoneiro em versão TUDO AO MESMO TEMPO. :-D

Milhaud adorava brincar com tonalidades simultâneas. Sua obra “Saudades do Brasil”, composta após sua temporada no Rio de Janeiro (ele foi secretário de Paul Claudel, adido cultural francês no Brasil), é repleta de trechos bitonais. Politonalidade também era “trendy” na época de Milhaud, as primeiras décadas do século 20. Stravinsky a usou extensivamente em “Petrushka” e “A sagração da primavera”, por exemplo. O efeito sempre é interessante.

Curta a “Suíte provençal” abaixo, tentando prestar atenção nas diversas vezes em que as vozes musicais parecem brigar entre si. É incrivelmente divertido! (E a obra em geral, baseada em temas e ritmos folclóricos da Provença, é muito bacana também.)